quarta-feira, 23 de junho de 2010

PRONTO SOCORRa-me senão morro no SUSto

A idéia deste texto é um simples retrato, ou melhor, uma descrição de momentos vividos dentro de um pronto socorro em Pelotas, e uma relação com uma notícia preocupante vinculada no jornal de maior circulação da cidade.

Esse relato é pertinente porque mesmo com as particularidades do sistema de saúde local, certamente em outras cidades o quadro não difere muito do nosso. Não é “achismo” (arte de achar) da minha parte, pois esporadicamente vê-se nos noticiários brasileiros a vida por entre os corredores de nossos hospitais públicos. Em geral são imagens desfocadas, frutos de câmeras escondidas (por que afinal de contas não se pode filmar a parte interna de um hospital), mas mesmo estas podem captar angustiantes momentos como a ultrajante permanência nos corredores do hospital, nada mais absurdo do que receber atendimento em uma maca, cadeira escolar ou até mesmo em pé.

A regra das disposições por paciente é conforme a gravidade da situação, ou seja, paciente grave deitado, nada mais obvio, mas o corredor é o leito por tempo incerto, tempo esse que quanto mais você passa mais angustiante lhe é, a começar pela sala de espera. Em situação recente tive “bom” tempo de espera, o que me oportunizou ver suntuosos lances como: pernas quebradas, de tal forma que eu não consiga imaginar que um dia será reconstituída, homenzarrão com ferimento na cabeça escondendo-se para não o verem chorar, ou ainda mães em desespero com seus filhos convalescendo em seus braços.

É, e a espera continua... Porque a lógica de atendimento é por ordem de desgraça (ou melhor, gravidade) e não por ordem de chegada. Nada mais justo, mas isso traz em mim (q fui ao PS por simples problema alérgico) um sentimento de culpa por estar ocupando tempo e espaço de outra pessoa com problema pior. Sentimento reforçado pelo médico, orientando que eu deveria ter procurado o posto de saúde do meu bairro.

Bom! Minha resposta é única: Se a alergia tivesse me avisado de sua chegada eu teria agendado uma consulta – com duas semanas de antecedência - para este referido dia. Pois no Postinho do meu bairro é assim: consulta, só agendando com no mínimo duas semanas de antecedência. Cabe lembrar que o atual Prefeito se elegeu dizendo que teria um posto em cada esquina, lógico que ninguém acreditou, mas é promessa de campanha, e tem de ser cobrada.

Depois de mais um “quando for assim não venha ao PS,” - afirmativa do profissional da saúde, que eu entendo e concordo perfeitamente - veio o diagnostico e a receita, e me resta trilhar corredores até a saída em que observo cenas que certamente ocorrem diariamente nos corredores: o paciente que reclama da demora em seu atendimento e o médico e/ou enfermeiro que justifica “estou fazendo o trabalho de 3”.

E a situação é exatamente esta, é difícil fazer milagre. Tenho a ligeira impressão que deve ser difícil trabalhar num espaço insuficiente, com menos profissionais que o necessário, escassez de material, reclamações constantes e ainda executar com agilidade, destreza e eficiência as tarefas que dizem respeito a nada mais nada menos que a vida de seres humanos. Que profissão difícil!!!

Ao ver os profissionais da saúde em um Pronto Socorro, me lembrei daquele personagem de seriado norte-americano, o “Magaiver”. Ele realizava sozinho tarefas das mais absurdas e perigosas com um mínimo de material. No entanto, até o Magaiver para construir uma bomba, por exemplo, precisava de uma mola, um parafuso e um chiclete. No caso dos nossos “Magaivers” da saúde, falta-lhes o mínimo de material, sendo assim muito mais difícil realizar as tarefas absurdas e perigosas do dia-a-dia de um Pronto-Socorro.

Talvez analogia com bomba não seja das melhores porque a idéia não é destruir, não se defende aqui a destruição do Sistema Único de Saúde. Muito pelo contrario, construir, ampliar, e urgentemente melhor administrar.

Aliás, em noticia do Diário Popular de sexta (18 de Junho) fomos informados que a Prefeitura de Pelotas deixou de repassar para Santa Casa 4,2 milhões de reais. O que obviamente acarreta em danos imediatos no atendimento.

O Excelentíssimo Secretário da Saúde enfrenta a situação afirmando que tudo pode ser resolvido mediante conversa. Conversa?! Pois é, mas que conversa fiada... hein? Esse dinheiro tem de ser repassado logo, imediatamente, pois a população não merece sofrer os reflexos.

O sistema já tem problemas, levando em conta a verba que é repassada pelo governo federal (que é insuficiente e consegue ser reduzida ano após ano). Pior ainda, se os administradores municipais não gerenciarem a saúde com a concepção de prioridade que o tema precisa, nossos corredores estarão mais cheios e nossos Magaivers estarão trabalhando por 10 e não por 3.

Júlio César Pinto Domingues - Professor de Sociologia e morador do Bairro Areal

2 comentários:

  1. Fiz minha parte em votar na consulta popular, mas com um pé atrás na área da saúde e ciente da possibilidade do dinheiro ser desviado. E o único prejudicado com o jogo de vaidades entre a prefeitura e a santa casa são os pacientes do SUS.

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  2. O que mais irrita são as carinhas de sempre prometendo melhorias na próxima gestão. Sendo que passaram 4 anos "farreando" com o dinheiro público.

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